O negacionismo econômico no Brasil atual: desafios e implicações
(O Brasil precisa urgentemente enfrentar a realidade de suas contas públicas. Um discurso negacionista apenas adia a implementação de soluções necessárias.)
Lucas Borges*
Durante a pandemia, discursos que minimizavam a gravidade da crise sanitária atrasaram a adoção de medidas necessárias, agravando impactos sociais e econômicos. Agora, em um contexto diferente, vivemos um novo tipo de negacionismo – o econômico. Assim como no caso da saúde pública, ignorar ou distorcer os fatos sobre a realidade fiscal do país traz consequências profundas e prolongadas. Infelizmente, não é incomum observar discursos que tentam desviar a responsabilidade dos desafios econômicos enfrentados pelo país, frequentemente colocando o mercado financeiro como o grande vilão. Contudo, em uma análise mais criteriosa observamos que a dinâmica dos receios do mercado em relação às contas públicas têm fundamentos objetivos e consequências práticas. Ignorar esses fatores é, no mínimo, arriscado.
Para líderes empresariais, a compreensão dessa dinâmica é essencial e corriqueira, pois as decisões econômicas do governo impactam diretamente o ambiente de negócios. A equação básica é clara: sem medidas eficazes para cortar gastos, o país enfrenta perspectivas cada vez menores de controle da dívida pública. Essa dívida, que já apresenta níveis preocupantes, tem crescido a um ritmo que compromete a sustentabilidade econômica no médio e longo prazo. Com uma dívida mais elevada, o Brasil passa a ser percebido como um país de maior risco, o que gera desafios significativos para empresas que dependem de estabilidade econômica para planejar e investir.
A percepção de risco, por sua vez, exige que o país ofereça juros mais altos para atrair investidores interessados em seus títulos. No entanto, esse ciclo cria um dilema: enquanto países mais seguros no exterior também aumentam suas taxas de juros, o Brasil se torna comparativamente menos atrativo. A consequência direta é a saída de capital estrangeiro, o que enfraquece o real em relação ao dólar. Para as empresas, isso significa custos mais altos com insumos importados, redução da competitividade no mercado internacional e pressões inflacionárias que afetam margens de lucro e preços finais.
O impacto da desvalorização do real vai além das cifras abstratas do mercado financeiro. Em um país cuja economia é amplamente dolarizada, a alta do dólar encarece combustíveis, equipamentos e matérias-primas. Para tomadores de decisão, isso representa a necessidade de estratégias mais robustas de gestão de custos e renegociação de contratos, além de maior atenção aos riscos cambiais. Desde combustíveis até alimentos, os preços são pressionados para cima, agravando a inflação e reduzindo o poder de compra da população, o que também afeta a demanda interna. Setores como manufatura, agronegócio e varejo enfrentam desafios adicionais para manter margens de lucro e competitividade.
Outro aspecto relevante é que, ao enfraquecer sua moeda e aumentar o custo de vida, o país enfrenta dificuldades em atrair investimentos de longo prazo. A instabilidade econômica e fiscal afasta potenciais investidores que buscam ambientes mais previsíveis e seguros. Tal fator significa operar em um ambiente de alta volatilidade, que demanda maior resiliência e capacidade de adaptação para garantir a sustentabilidade dos negócios.
Portanto, culpar o mercado pelo cenário econômico atual é ignorar a lógica subjacente dos eventos. O mercado atua como um termômetro, refletindo a confiança – ou a falta dela – nas políticas adotadas. A raiz do problema reside na ausência de um plano fiscal sólido e na incapacidade de promover reformas estruturais que garantam a sustentabilidade das finanças públicas.
Para quem busca prosperar neste cenário, é fundamental antecipar tendências, diversificar investimentos e adotar práticas de governança que priorizem eficiência e inovação. O Brasil precisa urgentemente enfrentar a realidade de suas contas públicas. Um discurso negacionista apenas adia a implementação de soluções necessárias, aprofundando os desafios e comprometendo o futuro econômico do país. A sociedade, os agentes econômicos e os formuladores de políticas públicas devem buscar, de maneira responsável e técnica, caminhos que assegurem estabilidade e crescimento sustentável.
*Lucas Borges, pesquisador e financista, especialista em Private Equity pela HBS e Financial Accounting pela LSBF.
Membro do Comitê de Empresas Familiares do Insper e Membro do Harvard Alumni Club Brazil (HACB)